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Crítica de Vingadores – Era de Ultron

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O reencontro dos heróis mais fortes do planeta é uma comédia

por Márcio Sallem

Vingadores - Era de Ultron

3estrelas
Desde que o senso de humor ácido de Tony Stark ajudou a Marvel a viajar dos quadrinhos aos cinemas de forma revolucionária, o recém inaugurado estúdio integrou esse elemento narrativo nas fórmulas bem sucedidas de todos seus filmes, alguns em maior quantidade (Guardiões da Galáxia), outros em menor (Capitão América: O Soldado Invernal), mas nenhum de forma tão inconveniente quanto Vingadores – Era de Ultron. Para Joss Whedon, que dirigiu e escreveu este e o anterior, tudo é motivo para piada, frases de efeito e tiradas, até quando a humanidade está à beira da extinção e a esperança de salvação repousa em fio frágil. Esse descontrolado timing cômico aleija a narrativa da tensão que os eventos apocalípticos deveriam provocar no espectador, e tira dele a dúvida de que os heróis não consigam salvar o dia, embora todos saibam que vão fazê-lo. E se nem a Marvel leva a sério o mais esperado filme do ano (junto do novo Guerra nas Estrelas), nós deveríamos fazê-lo por quê?

Antes de você, furioso, digitar que cinema é entretenimento, devo confessar minha ingenuidade em esperar que a Marvel avançasse em narrativa, justo o estúdio que nunca explorou o potencial de seus personagens além da abordagem segura que tem rendido cifras astronômicas a seus cofres. Por esta razão que funciona tão bem a gag metalinguística dita pelo Gavião Arqueiro de que “vai ser feito de plástico” – em alusão ao mercado de brinquedos que o ‘imortalizará’ em um produto. Aliás, quando eficiente e no tempo certo, o humor encurta distâncias e humaniza os heróis que, igual a todos nós, vão a festas, oferecem conselhos amorosos, orgulham-se das namoradas ausentes, divertem-se à custa dos amigos (Máquina de Combate) ou entre amigos (erguer o martelo do Thor equivale à saideira e à promessa de boas gags adiante), o que fortalece a relação de confiança e harmonia entre todos.

E Whedon já antecipava isso desde a primeira sequência: uma homenagem a melhor cena do antecessor, o plano sequência (ou “sequência”, isto não vem ao caso) que acompanha a ação colaborativa de todos os personagens já bem entrosados dentro da equipe. Eis a razão do objetivo de Ultron (voz de James Spader), robô “criado” por Stark para assegurar a paz mundial mas que, depois de adquirir consciência, resolveu ir de encontro à diretriz para destruir a população, obriga-o antes a fulminar os laços entre Vingadores, e para isto conta com os poderes dos gêmeos Pietro (Aaron Taylor-Johnson) e especialmente Wanda (Elizabeth Olsen), aqui chamados de ‘Aprimorados’ por razões contratuais, embora o fã sabe tratarem-se dos mutantes Mercúrio (visto em X-Men: Dias de um Futuro Esquecido, e melhor) a Feiticeira Escarlate.

Isto basta para elaborar, em quatro continentes, cenas de ação pouco ou nada eficientes, cortesia da montagem tresloucada de Jeffrey Ford e Lisa Lassek (que já haviam trabalhado no antecessor) e da incapacidade de Whedon em estabelecer com coerência a geografia e mise-en-scène de cenas e posicionar os personagens de forma que saibamos onde estão, o que estão fazendo, contra quem estão lutando etc. Whedon também erra por repetição (as cenas parecem iguais), extensão (as cenas não sabem quando terminar) e autoindulgência em agradar o eu-criança (os Vingadores lutam entre si… novamente), apesar de não estar disposto a arcar com as consequências de suas decisões. Como ocorre na luta destrutiva entre o Hulk e o Homem-Ferro, que certamente provocou mais mortes que a cena final de O Homem de Aço. Mas quem importa-se com estes efeitos colaterais em combates desenhados justamente para quem tem aversão a sangue?

Acredite, isto não é o pior que já vimos de Whedon, pois, como roteirista, ele se entrega a erros absurdos. Dá até para engolir os diálogos expositivos como um mal necessário de superproduções inseguras que mastigam informações ao público, recapitulam eventos passados e simplificam o conceito de ‘desenvolvimento de personagens’ a diálogos. Mas não dá para desculpar as fugas covardes de Whedon nas situações mais cascudas: um personagem reaparece sem explicação plausível para animar o corpo sintético de um personagem célebre; outro surge, após buscar respostas dentro d’água (?!), para conferir literalidade ao termo Deus Ex Machina; há até quem surja com aeronaves no exato momento em que a população precisa ser resgatada; e mesmo Stark não sabe explicar seu plano no desfecho.

Por falar nele, a continuação poderia ser chamada Homem de Ferro 4 e amigos, tamanho o protagonismo de Stark e acessoriedade dos demais. Mas veja que ironia, a superprodução dos olhos da Marvel é boa pra valer ao introduzir elementos do cinema de terror e reduzir a escala global de eventos ao nível humano. Robert Downey Jr., Chris Evans e Chris Hemsworth são bons atores, interagem bem e dominam facilmente personagens que interpretam há anos, porém os destaques são os menos superpoderosos Mark Ruffalo, Scarlett Johansson e Jeremy Renner: Banner, o menos beligerante, penitencia-se pelas mortes que o Hulk pode (deve) ter provocado, embora a mortalha com que se cubra surja na contramão de seu drama interno; já Natasha expõe-se como jamais fez, seja ao encarar o passado trágico, seja ao envolver-se com Banner, e há um plano no final particularmente triste que a reaproxima das sombras que a acompanharam desde sua apresentação em Homem de Ferro 2; por fim, Barton surpreendentemente desponta como o Vingador mais corajoso, justamente por ser quem tem mais a perder. Já Samuel L. Jackson, Paul Bettany e os citados Aaron Taylor-Johnson e Elizabeth Olsen estão restritos à necessidade e conveniência da narrativa.

Agora, o que dizer de Ultron? De olhar assombrosamente expressivo, mesmo sendo um ser criado digitalmente, o vilão da nova aventura enfrenta o conflito criador versus criatura com sarcasmo e ódio incubado. Somente aí distingue-se de todos os outros vilões meia-boca apresentados pela Marvel, até porque o vasto conhecimento deste Pinóquio do mal, todo obtido da internet que infestou (deve ser por causa disto), o faz tomar decisões estúpidas, cometer erros tolos e ser trapaceado até pelo Capitão América. Porém, se não fosse por Ultron, qual sentido haveria em justificativas ditas com seriedade como “Ele usou a internet para fugir”, no super-anti-vírus do Visão ou então na porrada entre softwares, jamais retratada antes nos cinemas?

O que nos leva à resposta à pergunta inicial, já que se a Marvel não leva a sério seus personagens e espectadores, eu mesmo que não vou fazê-lo.

Vingadores – Era de Ultron (Avengers: Age of Ultron, 2015, 141 min.). Dirigido e escrito por Joss Whedon baseado nos quadrinhos de Stan Lee e Jack Kirby. Estrelando Robert Downey Jr., Chris Hemsworth, Mark Ruffalo, Chris Evans, Scarlett Johansson, Jeremy Renner, James Spader, Samuel L. Jackson, Don Cheadle, Aaron Taylor-Johnson, Elizabeth Olsen, Paul Bettany, Cobie Smulders, Anthony Mackie, Hayley Atwell, Idris Elba, Stellan Skarsgård, Claudia Kim, Thomas Kretschmann, Andy Serkis e Julie Delpy. Estreia nos cinemas em 23/04/2015.

Vingadores - Era de Ultron 1

Vingadores - Era de Ultron 2

Vingadores - Era de Ultron 3


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